Stefany Krebs, 22 anos, e é meia-atacante do Palmeiras desde janeiro deste ano. A gaúcha foi duas vezes campeã mundial pela seleção de futsal para surdos e, aos 17 anos, foi eleita a melhor jogadora do campeonato, disputado na Tailândia. Tefy estreou pelo Alviverde no fim de setembro, em um jogo que, segundo ela, foi muito esperado.
A atleta conversou com o UOL Esporte e relembrou a dificuldade para se adaptar ao futebol de campo e ao próprio Palmeiras, “não só na comunicação, mas também para me equivaler ao nível e experiência das meninas com quem jogo”, diz.
“Fui aprendendo, entendendo o que a comissão técnica e as atletas fazem nos treinos —sempre com muita paciência e aprendizado. Depois da pandemia, voltei mais forte e focada. Por isso, na estreia, estava confiante”, afirma.
Nem sempre a confiança foi tanta —e nem sempre Tefy recebeu o apoio que afirma receber, hoje, no Palmeiras. “Teve um momento em que uma pessoa me disse ‘ah, mas você é surda, não vai conseguir evoluir na carreira profissional no esporte, como os times vão se adaptar?’. Preciso das pernas para jogar, e não da audição, e isso nunca me fez desistir. Eu quis mostrar que a minha deficiência não me atrapalha e hoje estou no Palmeiras, do futebol feminino profissional, pela primeira vez. É superdifícil, mesmo, mas nada é impossível”.
A atleta começou a jogar futsal aos 6 anos, por iniciativa do irmão, que a levava para uma quadra perto da casa em que moravam. Segundo ela, era o parente quem ensinava todas as regras do esporte. “Ainda criança, descobri que tinha paixão pela bola. Digo ao meu irmão que sempre vou jogar futebol por ele, porque foi ele quem me ajudou a descobrir esse dom e que sabia que eu seria capaz de evoluir”.
Os pais a incentivavam tanto quanto: o apoio veio desde que a atleta começou a jogar. “Tinha dias em que meus pais precisavam ir até o ginásio do lado de casa para me tirar de lá por ser tarde da noite. Mas sempre me apoiaram, desde o início. Um dia, quando criança, comecei a chorar porque achava que, por ser surda, não conseguiria ser atleta. Minha mãe veio até mim e disse: ‘Quando você quer uma coisa, é só não desistir que você consegue, sim’. E isso me fez querer tentar até o último momento”.
A mãe da jogadora ocupa um papel de destaque no sucesso da filha. Tefy assume que pensou em desistir devido à saudade que sentia da família, que mora no Rio Grande do Sul. “Disse à minha mãe que iria voltar, que estava me sentindo muito sozinha. Ela viajou dez horas para me ver, ficou comigo apenas por um dia. Conversamos muito e ela não me deixou ir para casa, disse que consegui chegar onde queria, que era meu sonho e que não deveria desistir. Aquilo me marcou muito”.
A persistência resultou em dois títulos de melhor do mundo — e Tefy conta que, a cada conquista, não sobrava tempo para comemorar: ela, em vez disso, intensificava os treinos.
“Pensava que eu não deveria ficar satisfeita com esses prêmios, tinha de treinar mais e mais. Ainda assim, a sensação de ser reconhecida é como realizar um sonho. Meu sonho se realizou. Quando lembro que posso representar a comunidade surda, nem acredito. Isso me faz continuar e me motiva ainda mais a treinar e trabalhar duro.”
Momentos de fragilidade, entretanto, fizeram parte do dia a dia da atleta, que pensou em desistir outras vezes, pela falta de acessibilidade e de respeito à sua condição. “Já saí de times porque senti que não fui respeitada. Uma vez, participei de uma reunião em que não havia intérprete de libras. Uma amiga minha sabia os sinais, e pedi a ela que me explicasse o que estava sendo dito. Não autorizaram. Me senti mal, senti que não tinha o direito de estar ali”, afirma.
Stefany conta que migrar para o futebol de campo foi o maior desafio de sua vida — já que, desde pequena, era apaixonada por futsal. “A modalidade é uma das minhas paixões e, quando fui para o campo, pensei ‘vai ser difícil, mas não é impossível. Vou abraçar a oportunidade’. Existem muitas diferenças, é um desafio, mas tenho aprendido cada vez mais”.
Todos os dias, meia hora antes do treino, a atleta encontra o preparador físico, o auxiliar, o analista de desempenho e o técnico do time para esclarecer quais serão as recomendações do dia. “Assim, consigo treinar mais tranquilamente e tem menos chance de eu ficar perdida. Isso tem me ajudado bastante”.
Além dos momentos em que sentia a falta da inclusão social, Tefy também precisou passar por duas cirurgias nos joelhos. “Precisei ficar longe do futebol por um tempo e isso acabou comigo, eu não me conformava com o que tinha acontecido. Foram esses os momentos em que, de fato, eu achei que deveria seguir outra carreira. Mas aprendi a respeitar meu tempo e meu limite, e cá estou hoje”.
Fonte: UOL Esporte