A TV Ines, única emissora do Brasil voltada para os surdos, saiu do ar por falta de verbas. A emissora era transmitida por satélite e pelas redes sociais.
Funcionários da TV ouviso pela coluna disseram que o MEC (Ministério da Educação) parou de fazer repasses para o Ines (Instituto Nacional de Educação de Surdo), que é uma instituição federal ligada ao ministério. A TV Ines era administrada pela Acerp (Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto).
O orçamento anual da TV era de R$ 10 milhões –menos que o aluguel do prédio da TV Brasil em Brasília (R$ 12 milhões por ano).
A EBC e a TV Brasil custam cerca de R$ 550 milhões por ano, sendo que R$ 378 milhões são só em salários, como esta coluna informou com exclusividade na semana passada. A responsabilidade primária pelo fechamento é da TV Ines é atribuída pelos funcionários ao MEC.
10 milhões com surdos
Cerca de 10 de milhões de brasileiros têm problemas auditivos –das formas mais leves de deficiência até a surdez total.
A programação da TV Ines era exibida 100% em Libras (Língua Brasileira de Sinais), com tradutores 24 horas por dia. O fechamento vai levar à demissão de, no mínimo, 30 pessoas.
Apesar da lei da acessibilidade obrigar as TVs comerciais a disponibilizarem a opção de legenda, isso funciona em muitos casos de forma mambembe. Muitas vezes as legendas são oferecidas automaticamente, cheias de erros de português e/ou com palavras fora de contexto.
Corte no orçamento da TV
Segundo fontes ouvidas pela coluna, em novembro do ano passado o presidente do (instituto) Ines, Paulo Bulhões, reduziu o orçamento de R$ 10 para R$ 8 milhões ao ano.
No entanto, Bulhões exigiu que os serviços continuassem sendo prestados pela Acerp da mesma forma que antes do corte.
Depois disso passou a pagar 50% dos valores mensais, e cada vez com mais atrasos. Sua justificativa era a de que o MEC também não o pagava em dia.
Quem indicou Bulhões para o cargo foi a primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Eleficou em segundo lugar da lista tríplice entregue à Presidência.
Apesar de receber metade do valor, a Acerp estava sendo pressionada a pagar 100% dos custos da TV Ines. A associação se recusou e a direção do instituto cancelou o contrato de forma unilateral.
O ministério já havia cancelado, e também unilateralmente, outro contrato com a Acerp em 2019, na gestão de Abraham Weintraub.
O ex-ministro planejava expulsar a Acerp e tomar “posse” da TV Escola.
No entanto, acabou descobrindo tardiamente que o governo federal não era dono nem da emissora, nem da concessão e nem da marca TV Escola.
Outros lados
Procurada ontem, a Acerp quis comentar, mas informou que a programação da TV Escola vai manter no ar um programa voltado para os surdos.
A coluna está tentando contato com a direção do Instituto Ines. Enviou mensagem ao órgão federal, mas não conseguiu resposta até o momento da publicação deste texto.
A coluna também tenta desde ontem um contato com o Ministério da Educação. Se e quando ele se manifestar, terá seu comunicado ou versão incluídos neste texto.
Disputa pelo poder
Segundo a coluna apurou, por trás do fechamento da TV Ines está uma disputa acirrada pelo Ministério da Educação.
O chamado Centrão está em rota de colisão com o ministro da Educação, Milton Ribeiro, e com o secretário-executivo, Victor Godoi Veiga.
O motivo é que os dois tentaram nomear aliados para cargos estratégicos no FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), que é dominado pelo Centrão –que reagiu violentamente.
A reclamação dos aliados de Bolsonaro sobre a tentativa de ingerência do ministro no “território” deles chegou à mesa do presidente, no Palácio do Planalto.
Além disso, os chamados “olavistas” (discípulos de Olavo de Carvalho), liderados pelo ex-ministro, Weintraub, e Carlos Nadalim, secretário de Alfabetização, aproveitaram a confusão e entraram na briga para derrubar Milton Ribeiro e Godoi.
Quem indicou Milton Ribeiro foi o Ministro da Justiça, André Mendonça, terrivelmente evangélico e provavelmente o próximo nomeado para o STF (Supremo Tribunal Federal).
Fonte: UOL