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De acordo com IBGE, em 2022, Brasil tinha cerca de 10 milhões de pessoas com deficiência auditiva

O Brasil tem cerca de 10 milhões de pessoas com deficiência auditiva, segundo apontado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022. Levantamento mais recente do Instituto Locomotiva, em parceria com a Agência Brasil, publicado em 2019, mostrou, na época, que 63% dos brasileiros com deficiência auditiva estavam fora do mercado de trabalho. O número reafirma a dificuldade que alguns surdos têm na hora de conseguir uma colocação, mesmo com a Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, instituída em 1991, com objetivo de assegurar a inclusão das PCD’s ao mercado.

Além disso, quando preenchidas as vagas, muitas vezes as empresas não incluem pessoas com deficiência auditiva porque consideram que a comunicação com esses profissionais é complicada, já que muitos utilizam a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Essa não é a realidade em todas as organizações. Em Boituva, na Região Metropolitana de Sorocaba, uma multinacional alemã, atuante no ramo de segurança industrial, além de empregar os surdos, implantou um projeto que oferece o ensino da Libras aos colaboradores. Atualmente, mais de 20 pessoas já participaram dos estudos que têm sido um diferencial para quem tinha dificuldade em se sentir pertencente ao espaço.

O montador Lucas Guilherme Dias da Silva está na empresa há seis anos e conta que, no início, a comunicação era baseada em bilhetinhos, o que demorava e dificultava em alguns momentos, já que o português não é a sua primeira língua e a estrutura gramatical é diferente. “Estou passando por um novo desafio dentro da empresa em um novo setor, mas percebi que, não importa onde trabalhe na empresa, encontro pessoas receptivas e dispostas a aprender o meu idioma para se comunicar melhor comigo”, relata o deficiente auditivo.

Caroline de Lima Morosett é surda profunda e trabalha há oito anos como operadora de logística. Com o ensino aos colegas, agora se sente mais pertencente à empresa. “Podemos entender as informações passadas, porque a empresa sempre se preocupa em chamar o Clayton (professor de Libras) para interpretar para nós quando necessário. Assim, não ficamos por último, de lado, para depois. Recebemos as informações em tempo real como todos”, disse.

“O nosso principal desejo é que estes colaboradores, assim como os demais que um dia ainda trabalharão conosco, sintam-se parte integrada da empresa e tenham a oportunidade de se comunicar com todos os colegas. É uma experiência incrível quando temos a oportunidade de cultivar esses relacionamentos. Eles se sentem felizes por receberem a nossa atenção e nós nos sentimos ainda mais felizes por conseguirmos conversar com eles”, aponta a Chief People Officer (CPO) da companhia, Hellen Ferreira.

Para além das empresas

As ações promovidas pelas empresas é realmente interessante e é um ganho a todos os deficientes auditivos para a inserção no mercado de trabalho, entretanto, assim como qualquer pessoa, eles têm uma vida normal e frequentam os mais diferentes espaços. O que os diferencia é o uso da língua de sinais (para quem faz uso dela como primeira opção) na hora da conversação, que pode ser mais complicada para o ouvinte que não a conhece. Por isso que, e para facilitar o acesso do surdo aos mais distintos ambientes, se faz necessário o entendimento da língua.

A Tatiele Gonzales Ribeiro Reis, de 37 anos, não tem nenhum familiar e não tinha conhecimento algum da Libras até 2019, quando iniciou o curso na igreja católica que frequenta. “Não é fácil, é um pouco complicado na verdade. Ela é complexa, é uma língua mesmo e tem que continuar estudando sempre. Mesmo indo à igreja todas as terças, em casa treinava bastante”, contou a farmacêutica.

Mas o real interesse surgiu enquanto trabalhava em uma farmácia e encontrava com alguns clientes surdos e percebia a dificuldade no atendimento, por isso Tatiele acredita que seja tão importante que mais pessoas e em diversos setores saibam a Libras. “Todos precisam de atendimento em banco, farmácia e é bom os ouvintes saberem, porque quando precisar, o surdo vai ter ali uma assistência e uma comunicação digna. Quando eu não sabia, os clientes da farmácia escreviam, e nem sempre dava para entender totalmente”, disse.

Para quem é surdo ou convive com um, atitudes como essa da Tatiele são essenciais. É o caso de Letícia Caroline de Oliveira, microempreendedora e mãe da pequena Sophia, de 10 anos.

“A acessibilidade é tudo nas nossas vidas, tivemos muitas oportunidades de encontrar pessoas em ônibus que no momento em que percebiam que a Sophia é surda vinham se comunicar com ela e claro que ela se sente lisonjeada, a empolgação é evidente. Eu como mãe sinto a importância disso e a satisfação é tremenda”, disse.

Sophia Caroline de Oliveira é surda bilateral profunda desde o primeiro ano de vida. A família até tentou introduzir o aparelho auditivo e o implante coclear como indicado pelos médicos na época, porém não obtiveram êxito. “O nascimento dela foi uma novidade para mim, a tive antes da maioridade. Quando foi diagnosticada com surdez realmente não sabia o que fazer, não tinha noção nenhuma da Libras e nas idas e vindas do hospital só me falavam do implante, que não deu certo por inúmeros fatores. Foi então que fomos atrás da língua de sinais depois de um tempinho e passei a entender um pouco e correr atrás por que entendi que só assim que a Sophia ia se comunicar”, explicou. Mesmo com o interesse da mãe em ajudar, a pequena só começou a ser alfabetizada aos 5 anos — antes elas usavam sinais caseiros, ou seja, muito parecidos com gestos que ouvintes usam — gerando um “atraso” educacional perante às demais crianças.

Por isso que microempreendedora acredita que seja tão importante que a sociedade saiba ao menos da existência da Língua de Sinais e o mínimo dos sinais básicos. “Hoje acredito que todos deveriam ter o conhecimento. É muito importante e necessário. Talvez, se no passado eu soubesse o quão importante é a Libras, minha Sophia teria iniciado a aprendizagem desde o diagnóstico e não teria sido tão tardio como foi. Então acredito que se todos soubessem o básico pelo menos, já faria toda diferença em nossa sociedade”, finaliza Letícia.

Aplicações

A língua de sinais também tem se tornado assunto de grandes produções cinematográficas pelo mundo a fora. E o assunto chegou a não apenas compor a lista de indicados ao Oscar — maior premiação do cinema –, mas ganhar a estatueta.

Em 2022, o filme “No Ritmo do Coração” venceu como Melhor Filme. Com atores surdos e ouvintes, o enredo que acompanha uma família de quatro pessoas na qual apenas uma filha é ouvinte. Aluna do ensino médio. Ruby se divide entre a paixão pela música e ajuda aos pais em quase todas tarefas do dia a dia. Com destaque no ramo musical, ela precisa se decidir por qual caminho seguir.

Já no ano anterior, 2021, a perda auditiva do baterista de heavy metal e os desafios dele ao aprender a se identificar como surdo é o enredo do longa “O som do silêncio”, vencedor da categoria de melhor som.

No Brasil, o campo educacional também notou a importância de se falar do assunto. Em 2017, centenas de estudantes tiveram que relatar os “desafios para a formação educacional de surdos no Brasil” na redação do Ensino Nacional do Ensino Médio (Enem). Na ocasião, 53 alunos tiraram nota mil.

Tal aplicação, para quem vive a deficiência no dia a dia, é de suma importância. “Ajuda e muito. O impacto que isso causa na sociedade e a importância que isso transmite aos surdos e as famílias é de extrema importância”, disse Letícia. (Thaís Marcolino)

Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul

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